Privataria Tucana lança luz às privatizações do governo FHC. Lançado na última sexta (9), livro some das prateleiras das livrarias apesar do silêncio de boa parte da mídia.
Por Sheila Fonseca, especial para o Vermelho
Apesar do silêncio quase unânime dos grandes veículos de comunicação, o livro A Privataria Tucana
chegou às livrarias no último fim de semana alcançando dois feitos: o
de sucesso editorial retumbante que deve posicioná-lo no topo dos
livros mais vendidos, e o de cair como uma verdadeira bomba no cenário
político brasileiro, trazendo denúncias documentadas sobre graves
irregularidades no esquema de privatizações do governo FHC, apelidadas
há tempos atrás pelo colunista Elio Gaspari de ‘privataria’, termo
utilizado no título do livro.
O livro, resultado de doze anos de trabalho do jornalista Amaury
Ribeiro Jr., foi alvo de polêmicas – assim como o autor – e
controvérsias nas eleições presidenciais de 2010, quando Amaury foi
acusado de participar de um grupo que tinha como objetivo a montagem de
um dossiê contra políticos tucanos. Na ocasião, Amaury Ribeiro Jr., que
terminou indiciado pela Polícia Federal, cita o livro e torna-se
personagem marcante na disputa presidencial.
O livro chegou às bancas na última sexta ( 9), publicado pela Geração
Editorial, e revela por meio de farta documentação extraída de fontes
públicas – como arquivos da CPI do Banestado – o esquema de lavagem de
dinheiro e pagamento de propina.
No livro, José Serra, ex-ministro da Saúde do governo de Fernando
Henrique Cardoso, figura como personagem-chave das denúncias.
Documentos revelam como amigos e parentes do político do PSDB operaram
um complexo sistema de irregularidades e fraudes financeiras.
Em entrevista exclusiva ao Vermelho, o jornalista Luiz
Fernando Emediato conta os bastidores de uma série de controvérsias
envolvendo o livro, esclarece boatos, responde frontalmente ao ataque
do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso dirigido ao autor do livro,
esclarece a tentativa de Serra de barrar o lançamento do livro, além
das denúncias de arapongagem sobre Amaury Jr..
A entrevista a seguir também traz passagens da vida profissional do
editor e polêmico jornalista Luiz Fernando Emediato, ganhador de
diversos prêmios, dentre eles o Esso.
Vermelho: A sua editora, Geração Editorial, desde seu lançamento no mercado com A República na Lama de José Neumanne, passando pelo bombástico Memórias das Trevas sobre ACM, até o Privataria Tucana,
segue a linha de publicação de temas polêmicos e reportagens
investigativas que revelam os bastidores da política. Como foi feita a
escolha por esse perfil de publicação? Livros de jornalismo
investigativo em geral têm bom retorno editorial?
Luiz Fernando Emediato: Começamos nossa história editorial, em
1992, há 20 anos, portanto, lançando instant books, como este do
Nêumanne que você cita e logo em seguida o Mil Dias de Solidão,
do Claudio Humberto Rosa e Silva, ex-porta voz de Fernando Collor.
Começamos assim porque em 1990 eu havia abandonado meu emprego de
jornalista e, ao decidir ser editor de livros, decidi também que
continuaria exercendo jornalismo publicando livros. Foi uma escolha
ética e profissional. O retorno é bom, não tanto quanto lançar livros
de autoajuda, de historias de vampiros para adolescentes ou romances
edulcorados para moças.
Vermelho: Privataria Tucana teve a primeira edição esgotada em cerca de 48 horas. Você esperava esse retorno? Apostava no tema?
LFE: Eu apostei no tema, quem não apostou foram as
livrarias. Antes de definir a tiragem eu consulto a rede livreira e ela
me indicava fazer apenas 15.000 exemplares, mais do que isso elas não
pegariam e eu teria que guardar no estoque. Então foi uma surpresa para
elas, não para mim. Meu feeling apontava para 100 mil exemplares, acho
que vamos passar de 300 mil.
Vermelho: Tem previsão de impressão de uma nova edição? Quantas cópias?
LFE: Já estamos reimprimindo 30.000 exemplares, estarão prontos sexta-feira.
Vermelho: Me fale da estratégia de divulgação do livro, como foi montada?
LFE: Como eu apostava no conteúdo devastador do livro, mas temia
que os grandes jornais não o levassem em consideração, ou divulgassem
com críticas pesadas, a estratégia foi não liberar o livro para a
imprensa, salvo para a revista CartaCapital, e trabalhar apenas com internet, blogues, Twitter e Facebook. Deu certo.
Vermelho: Você revelou em entrevista recente que José Serra
enviou um representante para propor uma conversa, na tentativa de
barrar a publicação do livro. Como foi isso?
LFE: Não foi isso. Um amigo comum – meu e dele – me convidou
para almoçar e, muito elegantemente, fez perguntas sobre o livro, a
pedido do sr. José Serra e, sabendo que eu ia publicar, perguntou se eu
não aceitaria ir conversar com o ex-governador. Respondi que não
tínhamos o que conversar e foi só isso.
Vermelho: Está circulando online uma matéria publicada em alguns
sites e blogs, onde (segundo a reportagem) José Serra teria entrado em
contato com a livraria Cultura para tentar comprar todos os exemplares,
na tentativa de retirar do mercado o livro. Esta sabendo disso?
LFE: Foi um boato, negado pela livraria. Não acreditei
nisso, José Serra não seria estúpido a ponto de fazer isso. Ele teria
que comprar 15.000 exemplares pelo pais inteiro, isso seria impossível.
Vermelho: Existem informações disseminadas em redes sociais, não
confirmadas, de que o livro estaria sendo retido em algumas livrarias
sob alegação de suposta ‘ordem judicial’. É verdade? Essa informação
chegou a vocês?
LFE: É falso. Não há, até o momento, ação judicial contra a circulação do livro.
Vermelho: Você espera processos em decorrência do livro por parte do alto escalão do PSDB?
LFE: Sim e não. Seria um erro o senhor José Serra ou
qualquer outro entrar na Justiça contra o autor e a editora. A
repercussão seria pior. Podem entrar com pedidos de indenização por
danos morais, se se considerarem injustiçados, mas, nesse caso, podemos
em reação pedir à Justiça que nos permita provar o denunciado. E aí
provaremos. Não vejo como os personagens citados no livro possam ganhar
qualquer ação contra nós. A verdade é uma só, não existem duas ou três.
Vermelho: Você possui bom trânsito e algumas amizades
no Partido dos Trabalhadores. Tem receio da instrumentalização política
alavancada pelas eleições municipais de 2012 e 2014? Acha que o livro
pode ser taxado por alguns de ‘petista’? Espera esse tipo de manobra
midiática?
LFE: Eu tenho bom trânsito com gente de todos os
partidos e de governos passados, assim como do atual governo. Fui e sou
jornalista. Conheço gente que está na política desde o governo do
general Geisel, que me perseguiu, aliás, com base na Lei de Segurança
Nacional. Fui amigo de Sergio Motta, a quem admirava muito, convivi com
Fernando Henrique Cardoso e muitos de seus ministros. Uma vez disse ao
José Sarney que, ao contrário de muitos, gostava de alguns romances
dele. Não sou filiado a partido nenhum. Tenho amigos no PT, na CUT e na
Força Sindical. Escrevi projetos com o ex-ministro Antonio Kandir, de
FHC. Fica difícil alguém acusar-me de estar a serviço do PT. Tenho
amigos no PSDB que estão me ligando, chateados, e eu lhes peço apenas
que LEIAM o livro do Amaury Ribeiro e depois venham falar comigo. As
provas contidas no livro são irrefutáveis e lamento muito por isso. É
realmente uma tristeza grande ler aquilo.
Vermelho: Nas eleições presidenciais de 2010 o jornalista
Amaury Ribeiro Júnior (autor do livro) foi pivô de denúncias de
arapongagem e na época o livro foi muito citado. Isso foi motivo de
preocupação para a editora? Você acha que ajudou?
LFE: Eu conheço o jornalismo de Amaury Ribeiro Junior,
jornalista investigativo, que não é rico e precisa trabalhar para
viver. Ganhou muitos prêmios no jornalismo, assim como eu, nós ganhamos
o Esso, o maior prêmio do jornalismo brasileiro, cada um com seu
estilo. O que fizeram com ele na campanha da Dilma Roussef foi uma
canalhice, ele nunca fez dossiê nem arapongagem, ele estava sendo
contratado (nem chegou a ser) para, com seu talento investigativo,
apurar fatos para a campanha. O dossiê do qual tanto se falava era este
livro, que na época não estava pronto. E ele, claro, não ia vender o
conteúdo do livro para campanha nenhuma, trata-se do trabalho de uma
vida, 12 anos de investigação, Eu não tive absolutamente nenhuma
preocupação. Eu li o livro antes de publicar, é claro. Não cortei uma
linha. Na verdade, acrescentei meia dúzia de linhas, em trechos que
pediam um pouco mais de pimenta. Com a concordância do autor.
Vermelho: O ex-presidente FHC declarou no último domingo (11),
durante sabatina a repórteres, que "O autor desse livro está sendo
processado. Está na Polícia Federal. Até lá, quem está sob judice é
ele.", saindo em defesa de José Serra. Vocês aguardam ataques contra o
autor na tentativa de abalar a credibilidade das denúncias expostas no
livro? O autor e a editora possuem alguma estratégia para rebater essas
críticas?
L.F.E.: O ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso
está mal informado a respeito do caso. Vai ter que puxar as orelhas de
sua assessoria, porque Amaury Ribeiro está respondendo a processos
assim como o próprio Fernando Henrique já respondeu e eu também. Ser
processado não é desonra. O que desonra é se somos justamente
condenados por algum crime.
Vermelho: Qual a repercussão dessas denúncias em sua
opinião no cenário político? Seria o fim da trajetória política de José
Serra? Acha que haverá investigação do Ministério Público?
LFE: A repercussão é enorme, espantosa. Não sei se é o fim de
José Serra, ele precisa se defender. E se ele não sabia de nada do que
sua filha e seu genro e amigos faziam? E se fizeram tudo aquilo em nome
dele, coitado? O problema é que ele está calado e usando seus meios,
que todos conhecem, para abafar o caso. Isso é muito suspeito. Quanto
ao Ministério Público, que investiga todo mundo com base em qualquer
denúncia, e-mails, recortes de jornais, imagino que vai entrar no caso,
sim.
Vermelho: Você é um jornalista premiado e teve sua
trajetória profissional marcada por vitórias e polêmicas. Incluindo um
Prêmio Esso por Geração Abandonada. Você tem predileção por histórias polêmicas? Como faz a seleção de seus temas?
LFE: Bem, eu tenho orgulho de minha carreira, eu fui
jornalista em jornais e na TV dos 23 aos 39 anos, deixei meu emprego
muito cedo, porque já havia chegado ao topo e não queria mais ser
subordinado a um patrão. Ganhei minha liberdade e sou uma pessoa
totalmente feliz. Nunca pensei em ficar rico, tenho os pequenos
negócios da família, a editora, estou produzindo filmes, e presto
consultoria (de verdade!) para pouquíssimos amigos do sindicalismo e da
política. Não é que tenho predileção por histórias polêmicas. O fato é
que vivemos tempos em que buscar a verdade já é, em si, procurar
polêmica.
Vermelho: Geração abandonada provocou a ira de
alguns dos jovens integrantes do movimento punk paulistano, como o
músico Clemente, líder da banda punk Inocentes, que chegou a falar:
“Foi a coisa mais estúpida que já vi escrita sobre punk”. Como foi sua
reação à reação deles? Chegou a conversar com eles sobre isso, já que o
Clemente chegou a escrever para o jornal reclamando?
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